
O pão molhado no café, quando criança, é uma das lembranças que Danielly Soares guarda com carinho. À época, aquela criança não fazia ideia de que a bebida viria a ser protagonista de um negócio seu na capital cearense. Fundadora do Amika Coffee, ela começou a se aventurar no ramo da gastronomia por prazer e curiosidade.
Apesar de ser formada em Publicidade e Propaganda, ela trocou o marketing para empreender no ramo do café, o qual começou como um hobby tardio e se intensificou após um curso de barista. A mudança de carreira surgiu do desejo de fazer algo mais dinâmico após um período estressante de trabalho em escritórios.
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O Amika nasceu de uma visão de negócio genuinamente baseada em cafés especiais, impulsionada por Danielly que, ao se tornar uma “chata do café”, como ela se descreve, pensou em fundar uma cafeteria fundamentada em três pilares: equipamento de ponta para qualidade de extração, cafés especiais únicos e baristas com técnica e paixão pela bebida.
O negócio amadureceu ao longo do tempo, junto com Danielly, expandindo-se para incluir uma escola e uma torrefação. Ao Sabores da Cidade, ela conta mais sobre sua trajetória, o Amika, os desafios de empreender na cidade e as tendências do mercado do café.
Leia a entrevista completa abaixo.
Sabores da Cidade: Danielly, o que despertou em você o interesse inicial pela gastronomia e, especificamente, pelo universo do café?
Danielly Soares: Cozinhar sempre foi uma atividade presente na minha família. Comer, para nós, sempre foi um ato de prazer e curiosidade. Experimentar coisas novas e replicar receitas de viagens sempre fizeram parte da minha rotina.
O café começou como um hobby tardio, que ganhou maiores proporções depois que fiz um curso de barista. Foi ali que pude vivenciar e me apaixonar pelo ambiente de cafeteria. Após anos como aficionada por café, troquei a Publicidade para empreender neste ramo.

Antes de criar o Amika, qual era a sua relação com o café?
Minhas memórias de infância mais antigas com café são de tomar a bebida, molhando um pão carioquinha com manteiga. Por alguma razão, passei a adolescência longe das xícaras.
Só voltei a tomar café com frequência durante a faculdade, e foi aí que minha curiosidade pela bebida foi verdadeiramente despertada. Eu queria reproduzir os drinks de café em casa, comprar equipamentos e conhecer mais sobre o café como insumo.
E antes de abrir a cafeteria, qual era sua área de atuação? Houve um processo de mudança de carreira?
Sou formada em Publicidade e Propaganda. Desde cedo, trabalhei no marketing interno de algumas empresas e passei um tempo também na área acadêmica.
Em um dos momentos mais estressantes da minha carreira, eu gostava de ir a cafeterias para pesquisar referências de design em livros e revistas, enquanto tomava um café.
Eu entrava no escritório com a luz do dia e saía à noite, na frente de um computador. Um dia, desejei fazer algo diferente, algo que fosse mais dinâmico.
Como nasceu a ideia do Amika? O conceito atual já estava claro desde o começo ou foi se construindo ao longo do processo?
Estudar café me tornou uma ‘chata do café’. Com isso, passei a não frequentar mais cafeterias e a tomar a bebida apenas em casa. Com o tempo, comecei a vislumbrar um negócio genuinamente baseado em café: cafés especiais direto do produtor, as melhores máquinas e baristas treinados constantemente.

Você pode imaginar, projetar e executar o seu negócio, mas as experiências e o ambiente vão moldar e cortar as arestas. Houve um amadurecimento gradual do conceito inicial, que acompanhou o meu amadurecimento como empresária. Com o tempo, a cafeteria também se tornou uma escola e uma torrefação.
Quais foram os principais desafios de abrir uma cafeteria em Fortaleza?
De todas as dificuldades comuns a qualquer negócio, acho que a nossa cultura de café foi e continua sendo o maior desafio. Como o fortalezense vê uma cafeteria? Qual é o principal produto de uma cafeteria? Na minha cabeça, o café. Mas, infelizmente, o cliente vê a cafeteria como qualquer outro estabelecimento de Alimentos e Bebidas (A&B), primordialmente para comer.
Não que seja proibitivo ter uma boa comida, mas antes de tudo deve haver um ótimo café e um serviço de café excelente. Em 13 anos de mercado, é muito comum ouvir: ‘não gosto de café’, ‘não tomo café’, ‘tem refrigerante?’. Ainda acho isso uma heresia. Você não vai a um restaurante japonês para dizer que não come sushi, não tem lógica.
Assim, muitas cafeterias tentam se adaptar adicionando chás, sucos e outras bebidas, além de muitas opções de comida. E isso é um erro, porque joga o café para a penumbra. Já é um grande desafio fazer bons cafés, ter uma boa comida, ambiente e serviço, junto a um excelente café, é como procurar Shangri-La. A gente sabe que é utópico, mas buscamos alcançar esse paraíso.
O que você queria oferecer ao público que ainda não encontrava nas cafeterias da cidade?
Existiam três coisas que eu não encontrava e transformamos isso nos três pilares do Amika: equipamento de ponta que entrega qualidade de extração, cafés especiais com qualidade única e uma equipe de baristas com técnica, conhecimento e amor pela bebida.
Como foi o processo de aprender sobre gestão, fornecedores, operações e toda a parte “não romântica” do negócio? Nesse sentido, quais foram os maiores desafios?
Essa é a escola mais longa da minha vida. A princípio, você não encontra nada e não sabe nada. Das burocracias a entender o fluxo e a logística do seu negócio, leva-se um certo tempo. Isso pode frustrar os mais imediatistas e ansiosos. Talvez por ser muito resiliente, eu tenha aguentado um pouco mais.
Fortaleza tem muitas carências que não condizem com o tamanho da cidade. Estar longe dos principais fornecedores do mercado de café é meu principal desafio. Trazer sacas de café de outros estados é uma grande jornada em termos de burocracia e logística, e consequentemente o preço será alto. Infelizmente, ainda conseguimos pouco café diretamente do nosso estado.
Como você enxerga o atual mercado de cafeterias em Fortaleza? Está saturado, em crescimento ou ainda tem muito espaço para inovar?
Tivemos um grande crescimento na última década, mas o pós-pandemia levou alguns empreendimentos muito legais que tínhamos na cidade, fazendo-nos andar um pouco para trás. Mas, como todo movimento de mercado, depois de uma baixa, há uma alta. E creio que será esse o momento, mas o conceito dos negócios deve estar bem ‘redondo’.

O ambiente não será amigável para o despreparo, ainda mais com as mudanças tributárias. Estar cercado por bons profissionais será imprescindível. E o principal: seu negócio tem que ter alma. Cafeterias são lugares diferentes.
Não se trata apenas de bom café, comida e ambiente, mas também de um lugar de hospitalidade. Sua cafeteria tem que fazer sentido no local em que está inserida. Melhor que inovar ou tentar inventar a roda, é fazer café bem feito.
Como é feita a curadoria dos grãos que vocês servem no Amika? Quais as opções especiais da casa?
Ao longo dos anos, fomos construindo relações de comércio e amizade com produtores. Temos o prazer de explorar, selecionar e torrar cafés das mais diversas regiões do Brasil, incluindo Cerrado Mineiro, Chapada Diamantina, Mogiana, Montanhas do Espírito Santo, Sul de Minas, Serra do Caparaó e Maciço de Baturité.
Adotamos o conceito de direct trade (comércio direto) para garantir um relacionamento sólido com os produtores e valorizar o seu trabalho através de um comércio justo e transparente. Aqui, o cliente está seguro de provar cafés que são disputados pelas melhores cafeterias do mundo.
Com o elevado preço do café, como tem sido a adaptação aos altos custos do mercado?
Sou a mais otimista dos pessimistas. Infelizmente, a crise no preço do café é uma crise climática. Enquanto torrefação, há pouca coisa que possamos fazer. O que o café passa é o que já vimos recentemente com culturas como azeite, cacau, baunilha, todas extremamente sensíveis às variações climáticas.
Ainda estamos absorvendo essas altas e, infelizmente, é um quadro que não vai se alterar. Não teremos um efeito de volta a patamares passados. A solução das cafeterias e torrefações é ser extremamente assertivo na escolha do café e procurar melhores soluções em questões de embalagens. Ninguém vai abrir mão de um bom café, mas é inevitável que o consumo baixe.
Além de gestora de um negócio, quem é a Danielly no tempo livre? O que gosta de fazer?
É difícil ‘sair do negócio’. Depois de anos complicados, como 2020 e 2021, decidi que é importante ser a Danielly pessoa física. No meu pouco tempo livre, sou uma jogadora de videogame mediana, uma cozinheira com algumas receitas de sucesso e uma viajante apaixonada.
Viajar é a condição irrevogável que dei para o meu negócio. É a única hora que me desligo de tudo. Eu tento ir para longe e ter contato com a natureza, mas inevitavelmente levo o café para a viagem, sempre visitando cafeterias e feiras pelo mundo.
Amika Coffee
Instagram: @amikacoffee
Endereço: Av. Des. Moreira, 2689 – Dionísio Torres
Funcionamento: Segunda-feira a sábado, 11:30h as 19h